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Cuidar de idoso: identificar e respeitar necessidades essenciais

Cuidar é uma mistura de arte e de técnica, emoção e razão, intuição e bom senso. Se é fácil juntar as palavras para descrever o que seja cuidar, não é tão fácil na hora de tomar decisões. Neste artigo, você encontrará a história de dona Genoveva que simboliza várias histórias reais e decisões também reais. Em seguida, você encontrará alguns pontos que precisam ser considerados quando temos que tomar decisões sobre aqueles que recebem nossos cuidados.

Recentes acontecimentos na história de dona Genoveva

Dona Genoveva, 84 anos, recentemente ficou viúva. Até então morava com o seu marido e vivia uma rotina própria para a idade do casal. Logo após a morte de seu marido, a família considerou que dona Genoveva não poderia mais viver sozinha e, como decisão, Genoveva foi morar com sua filha, genro e seus netos.


Ela está em uma situação bastante particular, já que sua filha e seu genro se desdobram para garantir que ela tenha toda forma de atenção possível. Reorganizaram espaços da casa e o tempo livre para que cada um compartilhe um pouco a responsabilidade de dar atenção à matriarca.


Entretanto, dona Genoveva sente falta de toda sua rotina como era antes, as saídas com o marido, a organização de sua própria casa... Na casa de sua filha ela receba muita atenção, está até se alimentando melhor, pois sua filha reorganizou sua alimentação de maneira mais adequada; também dona Genoveva se esforça cada vez menos já que sua filha se desdobra cada vez mais para realizar todos os serviços de sua mãe.


Mas dona Genoveva não se sente tão bem: sofre pela perda do marido e de muitas outras coisas como o ambiente de sua casa, sente falta da organização de suas coisas dentro de casa, ela sente falta da vida que ela tinha.


Recentemente houve um conflito entre a filha e a mãe. Dona Genoveva costumava frequentar às terças-feiras um encontro de senhoras da comunidade para rezar o terço. Como a filha nesse horário não pode acompanhar a mãe, resolveu não permitir que ela comparecesse aos encontros, mesmo que a casa da filha fique mais próximo do que a sua antiga casa e dona Genoveva considerou isso um peso muito grande...

Cuidar é interpretar necessidades

Cuidar é antes de tudo reconhecer, interpretar e responder às necessidades do outro.

Nós temos vários tipos de necessidades. Necessidade é tudo aquilo que garante a manutenção da nossa existência. Eu posso falar de uma necessidade física como alimentação, hidratação, repouso, exercício; sem essas coisas o corpo humano definha, mas posso falar também de necessidades sociais, por exemplo segurança, educação, formas de convivência e cultura.


O ser humano é depositário de um grande número de necessidades. Pode-se dizer que o ser humano é permanentemente indigente, ele é precário! Se certas necessidades não forem atendidas, a sua vida não se mantem.


Agora nós iremos analisar algumas necessidades propriamente humanas porque vão além das necessidades físicas; quando falamos desse tipo de necessidade ressaltamos necessidades que se relacionam com a liberdade e a vontade de cada pessoa. (Para uma consideração mais abrangente sobre os aspectos essenciais do cuidado, ver página 66 em diante em ENVELHECIMENTO & SOCIEDADE.)


A primeira necessidade que pode ser observada é a necessidade de ordem. Dia a pós dia criamos para nós uma rotina, temos um horário para acordar, organizamos os modos para que realizemos as coisas, decidimos em que momento fazer isso ou aquilo e, frequentemente, uma pessoa quando está sob cuidados a primeira coisa que perde é aquele domínio sobre a organização do seu dia!

Ao cuidar, preciso me perguntar: quanto estou alterando a rotina do outro? Quanto estou impactando no seu modo de organizar sua vida?

Se quisermos responder de maneira humanizada àquele de quem cuidamos, uma atenção importante é tentar, na medida do possível, preservar aquela ordem que a pessoa conhecia e costumava organizar a sua vida.

Outra necessidade importante é a necessidade de liberdade que nem sempre sabemos atender ou respeitar quando nos colocamos a cuidar de alguém. No caso de dona Genoveva, por exemplo, sua filha garantia vários cuidados que têm a ver com a necessidade do corpo, mas privava sua mãe da possibilidade de tomar certas decisões que são importantes para que ela se identifique como uma pessoa capaz de responder até certo ponto por si mesma.


A necessidade de liberdade significa a possibilidade de escolher, de se autodeterminar, de se decidir sobre si mesmo.

É óbvio que aquele que está sob cuidados nem sempre dispõe de um grau elevado de autonomia, a sua situação de dependência é muito mais clara, porém ao cuidar das pessoas somos chamados a tomar cuidado com a diferença entre cuidar e dominar.

Uma outra consequência dessa necessidade é a necessidade de responsabilidade. Ainda que a pessoa esteja em uma situação bastante difícil, é sempre importante se perguntar o quanto de responsabilidade essa pessoa pode ter, por si mesma e pelos outros.


A necessidade de ser responsável corresponde na linguagem comum à necessidade de ser útil.


Talvez uma pessoa enferma não possa fazer missão, ela não possa fazer um trabalho comunitário voluntário, mas mesmo a pessoa que está acamada pode rezar pelos outros. Talvez essa possa ser uma forma de se sentir responsável por aquilo que está a seu redor.


Outra necessidade que deve sempre ser considerada é a necessidade de honra e respeito, pois muitas vezes a pessoa enferma, ou sob cuidados, perde vários aspectos de controle da sua vida. Em algumas situações nem é capaz de fazer suas necessidades sozinha, precisando de ajuda de parentes ou de um acompanhante. Porém, deve-se sempre tomar cuidado para que haja um grande respeito pela pessoa.


A necessidade de honra diz respeito a esse núcleo mais fundamental do valor sobre si mesmo e que principalmente a pessoa mais enferma não pode perder.


Há duas necessidades que devem ser equilibradas: a necessidade de segurança e a necessidade de risco. São como uma espécie de desdobramento da necessidade de liberdade.


A necessidade de risco se manifesta às vezes com o desejo de tentar fazer alguma coisa além do que parece possível. Foi assim que aprendemos a dar os primeiros passos no início da vida e enquanto houver forças sempre tentaremos fazer um pouco mais. Isso é mais do que simples teimosia, isso é eco da necessidade de liberdade que está presente em cada pessoa.


Por isso, o cuidador deve saber equilibrar sua responsabilidade de zelar pela segurança do que recebe cuidados ao mesmo tempo respeitando, dentro dos limites razoáveis, o desejo de risco e de superação que toda pessoa traz dentro de si.


Enquanto vivemos sempre queremos superar nossos limites. Isso é humano, essencialmente humano.

A pessoa que está sob cuidados tem necessidade também de ter aqueles objetos que são seus, às vezes, se trata de uma foto, se trata de uma peça de roupa ou até um aparelho da casa... Mais importante que o valor econômico de um objeto é o seu valor simbólico. E o cuidador sempre precisa se perguntar: o que isso representa?


Às vezes, acontece de um jovem que, querendo organizar a casa do pai ou do avô, começa a jogar fora um monte de quinquilharias, mas na verdade para o dono dessas supostas quinquilharias se tratava de uma memória viva, o registro da memória de tantos fatos e de tantas coisas vividas.


Uma outra coisa importante em relação a essas necessidades é a necessidade de verdade. É óbvio que nem todas as informações talvez sejam salutares para serem comunicadas à pessoa que está sob cuidados, mas deve se evitar aquela espécie de pacto de silêncio, aquela simulação ao redor do enfermo que muitas vezes cria nele mais tensões do que exatamente tranquilidade.


Finalmente a última necessidade é a necessidade de enraizamento, de colocar raízes. Ainda que esteja sob cuidados, a pessoa vive e vivendo tem desejo de criar história relacionada à vida de outras pessoas que estão a seu redor.


Deve-se haver um cuidado na medida do possível para que o enfermo se sinta como parte de história. A história não termina no seu leito. Ou melhor, no momento que começou a doença a sua história continua.


Acompanhe nosso curso ENVELHECIMENTO & SOCIEDADE. Link para a 3ª aula, correspondente a alguns pontos dessa leitura.



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